domingo, 10 de janeiro de 2010

Filme Triste

Se há um povo que tem mania de artista é o piripiriense. Tudo em Piripiri vira comédia, drama ou ficção científica. Lá, já inventaram que um integrante da banda Dragões 6 teria sido abduzido por extraterrestres e convidado a dar um passeio em um disco voador. Os conterrâneos de João Cláudio Moreno também juram que Nascido em 4 de Julho, de Oliver Stone e com Tom Cruiser, foi feito em homenagem ao aniversário daquela cidade, comemorada na data homônima. Agora, com o afogamento de mais um jovem nas águas do Caldeirão, o povo de Piripiri acredita que, nas profundezas do açude, reside algo como uma Anaconda, a cobra cinematográfica que engole pessoas. A verve artística do município não é de toda ruim. Talvez seja a razão da exportação de grandes astros como Amauri Jucá, Dirceu Andrade e o próprio João. O problema ocorre quando a mente fantasiosa ignora o real. E a realidade é a carência. No caso do mais recente afogado, um menino turista de 19 anos, não há que se falar em sucuris ou outros bichos. Há que se protestar pela negligência das autoridades que não dão segurança nenhuma aos banhistas nem fiscalizam os que trafegam no sedutor Caldeirão, cujo atrativo maior são, além das manobras de Jetski e dos saborosos peixes, os passeios em canoas que transportam famílias inteiras sem a mínima segurança. Um filme sem muitas chances de final feliz.

sexta-feira, 8 de janeiro de 2010

Mateus, ao menos o teu

Escrevi o último post na véspera de Natal. Não há quem produza da mesma maneira quando as festas de final de ano se aproximam. Algo estranho nos acontece. Há quem fique mais religioso, outros mais reflexivos, sem falar nos que, nesta época, expelem amabilidade e doçura por todos os poros. Como se o bem tivesse data pra ser feito. Eu, no Natal, fico mais deprimido. Não sei se afetado pela leitura que faço da campanha desenfreada do comércio, estimulando todos a comprar. Só me vêm à cabeça os que não têm um algum sequer para um bife na noite do dia 24. Ou mesmo as pobres crianças que se frustram ao levantar da cama, pela manhã, e não encontram o tão anunciado presente deixado pelo lendário Noel. Como refém midiático, este ano eu também me rendi ao sistema. Doei um presente a um menino pobre, de nome Mateus, na véspera de Natal. Fui solidário por um dia. Minha mãe foi quem indicou o guri. Um moleque, que mora numa vacaria, cujo maior sonho era um carro com controle remoto. Comprei o mimo numa barraca do Paraguai. Fui deixar em mãos. O bambino não conteve as lágrimas ao ver o presente. Foi tanta emoção que ele largou o carro de lado para abraçar minha mãe. Aí choramos todos. Eu, minha mãe e o pequeno. Ele, de emoção. Minha mãe, de compaixão. Eu, de peso na consciência. Custa tão pouco protagonizar felicidades diárias que não se justifica fazê-las apenas uma vez por ano.

sexta-feira, 18 de dezembro de 2009

O Jânio do Delta


A hilária política piauiense não poderia terminar o ano sem outra cena: o deputado Deusimar Brito, o Tererê, carregando, a tiracolo, um feixe de vassouras por entre as bancadas da Assembléia Legislativa do Piauí. O fato ocorreu na segunda-feira (14). Tererê pretendia subir à tribuna com a penca de vassouras, e só não o fez porque o presidente da Casa, Themístocles Filho, aconselhou o parnaibano a deixar de ser ridículo. A intenção do parlamentar peessedebista era dar uma de Jânio Quadros, mas, ao contrário do ex-presidente do Brasil, Tererê não queria varrer sujeiras, mas as mentiras que ele diz que o governo conta quanto à construção de estradas no Piauí. Tererê é um político em extinção. Sua maior marca é protagonizar o risível. É dele, por exemplo, a pérola: “Isto aqui está virando um pavio de pólvora”, quando, na verdade, queria se referir à expressão popular “barril de pólvora”, que traduz situações críticas, delicadas. Não se espante se as urnas avalizarem e prorrogarem as peripécias de Tererê, nas próximas eleições. Pelos que posam de sérios descambarem para a galhofa pode ser que os galhofeiros sejam levados a sério pelo respeitável público.

quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

Calado, e Ainda Errado


Ser politicamente correto virou mais que uma obrigação: virou charme. Intelectuais, políticos e até conquistadores baratos vêm usando de tiradas ambientais, raciais, preservacionistas para engabelar suas vítimas. E vem colando. Outro dia vi um bebum, no Chamegão do Forró, querendo impressionar uma sirigaita dizendo que só come alface. E orgânico. O falatório é tanto que vira uma espécie de dogma. E a mídia dá a sua colaboração para institucionalizar a nova ditadura comportamental. São novelas, personagens, produtos, atitudes que têm a ver com o novo mote. E ai de quem sair da linha. Ontem mesmo fiquei numa sinuca de bico. Meu assessorado Fábio Novo, sem a menor maldade muito menos preconceito – quem o conhece sabe que ele rechaça toda espécie deles – disse, na imprensa, que votar em Heráclito Fortes era voltar a um passado negro. Pronto. O céu desabou sobre nossas cabeças. Alguém que defende direitos humanos, mesmo sem eles serem agredidos, ligou, enfurecido, pra mim: “Olhe, diga a seu deputado que não se usa mais essa expressão!”. Eu retruquei: “Mas, querida, ele não quis macular ninguém. É um eminente defensor dos desvalidos, dos perseguidos, das minorias...”. E lá vem a voz de trovão, de novo: “Minorias? Olha, não se usa esse termo também, viu? É politicamente incorreto, é preconceituoso, é...”. Desliguei. Sei lá o que minha não-intenção diria da próxima.

segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

Agora Eu Passo


A Câmara dos Deputados aprovou, na última quarta-feira (9), o Projeto de Lei 4118/08 que proíbe as organizadoras de concurso público de exigir conteúdos além dos necessários para o cargo oferecido. Tal informação deu-me uma leve impressão de “agora vai”. É que dentre a penca de projetos que tenho está o de ser funcionário público. O maior é o de levar a vida escrevendo. Mas o cara só faz isso se ganhar bem e trabalhar pouco, coisa que só acontece com quem é concursado. Entretanto, a exigência do Ó do Borogodó em tais pleitos sempre me afugentou. E isso não é de hoje. Já no colegial eu tinha a certeza absoluta de que pro meu estilo de vida jamais precisaria aprender a Lei de Lavoisier ou destrinchar uma equação química. Ainda não senti falta de tais conteúdos. O mesmo eu andava dizendo do que se pede em concurso. Os caras inventam uma teoria todo dia. O serviço público não melhora, mas os cursinhos preparatórios se atopetam de gente tentando aprender o sexo dos anjos. A notícia da aprovação do projeto veio justamente quando eu já começava a sacar a Teoria Jurídica das Instruções da Avestruz, cujo segundo nome é Teoria da Cegueira Deliberada. Ela explica situações em que o agente público finge que não vê produtos de crimes sob sua barba. Como uma avestruz, o funcionário enterra a cabeça. Faz sentido. Mas só isso.

quinta-feira, 10 de dezembro de 2009

Fome de Bola


A imprensa do Piauí (claro, há quem escape) potencializa os sintomas de quem sofre de tédio. Meu médico já me proibiu. Mas eu insisto. Hoje, fui premiado pela minha perseverança. Quando já ia me contentando com qualquer coisa, do tipo: ver mais um capítulo do PMDB ensaiando um novo adultério político, eis que vejo o blog Na Esportiva, do amigo Fábio Lima. E pensei: a gente tem jeito sim. Ver o Cabeça de volta às letras esportivas é mais que gratificante. Ele, que ama o gênero, foi mais um desgarrado pela pobreza piauiense neste setor. E digo: demorou a ir-se. Eu fui na primeira vez que vi um colega radialista implorar um sanduíche ao Ronaldo Buccar, ex-goleiro e ex-presidente do Esporte Clube Flamengo. Ronaldo tentava driblá-lo pelos corredores do Albertão, mas o famélico não desistia. Implorava por um naco de pão. Aquilo me deu náusea. Lembrei de Antônio Carlos Magalhães, que disse certa vez, sobre jornalistas: o maior erro é oferecer dinheiro a quem quer informação e oferecer informação a quem quer dinheiro. Aqui, pra nós, - eu pensei - oferecendo comida tudo se resolve.

terça-feira, 8 de dezembro de 2009

Turismo de Roça Brocada


O mundo se reúne na Dinamarca para discutir a questão climática. Muitos figurões participam da Cúpula do Clima de Copenhague. Calcula-se que, ironicamente, 41 toneladas de CO2 serão produzidas na capital dinamarquesa pelos 120 jatos e 1.200 limusines que transportarão alguns ilustres convidados. A tônica do evento é achar uma solução para os efeitos colaterais originados da disputa entre ganância humana X meio-ambiente. A desconfiança sobre o que sai na mídia me tornou um cético. Se a imprensa escolhe um tema como bombardeio da vez minha primeira tendência é não acreditar. Ainda hoje acho, por exemplo, que aquele desembarque americano na Lua foi filmado num estúdio de Hollywood. E quando vi, na TV, geleiras desmoronando sobre ursos que corriam apavorados, minha impressão foi a mesma: é ficção. Mas, algo deve estar mesmo acontecendo ao clima. O calor de Teresina passou de cartão postal para questão de Estado. Parte de Cocal sumiu do mapa, no início deste ano, depois de um tsunami. E as margens de nossas BRs estão sendo torradas para serem transformadas em roças, às barbas das autoridades. Logo, sair da capital rumo ao interior não é mais contemplar a paisagem verdejante das matas marginais. É, isto sim, atravessar desertos. Se os astros de Compenhague não encontrarem uma saída rápida e eficiente para esse caos, a única coisa de verde que veremos em nossas viagens serão as placas do Dnit dando a distância dos municípios.