segunda-feira, 30 de novembro de 2009

Modus Operandi


Eu já estava com saudades. Nunca mais a mídia havia falado em um caso de corrupção de grandes proporções no Brasil. No máximo, um prefeitozinho extorquindo dinheiro de populares para construir uma pracinha aqui, outra acolá. Enfim, coisa pouca. Mas eis que o mensalinho do Distrito Federal veio à tona, fidelíssimo à sua versão nacional. Com direito, inclusive, a esconde-esconde de dinheiro nas vestes. Leonardo Prudente, presidente da Câmara Distrital do DF, preferiu como esconderijo dos maços as próprias meias. O episódio me fez lembrar o saudoso Pedro Alelaf que, reza a lenda futebolística piauiense, escondia a maior parte do dinheiro das rendas dos jogos do Parnahyba, clube do qual era presidente, nas meias. E, quando seu time ganhava, corria para não ser carregado pelos torcedores, temendo uma derrama e um flagrante. O que mais me enoja nos políticos brasileiros é o modus operandi. Entendo que até para ser ladrão o cara tem de ser profissional. Esconder grana em cueca, em meias, além de não ser higiênico, é muito cafona e amadorístico. Roubo que se preza tem de ser como ao do Banco Central de Fortaleza. Com túneis cinematográficos, logística perfeita, sigilo absoluto. Os políticos do Brasil, apesar dos anos de estágio, ainda não aprenderam a arte de pegar no alheio. Será arte?

sábado, 28 de novembro de 2009

O Rambo das Árvores


As donas de casa que residem na zona norte de Teresina já devem tê-lo conhecido. Ele circula pelas ruas do Marquês, do Centro, do Aeroporto, do Mafuá, do Por Enquanto, Cabral, Vila Operária e adjacências. Veste-se todos os dias para uma guerra imaginária. Traz consigo os apetrechos necessários: cordas, cinto, facas e um machado niquelado que mais parece uma bazuca. Aliás, ele o carrega como uma arma de grosso calibre. Não anda, marcha. Não vive, sonha. Todos o conhecem como Rambo. E é assim que ele quer ser chamado. Mas, contrário do herói homônimo de Sylvester Stallone, que trucida exércitos sozinho, usando uma metralhadora de munição contínua, o Rambo de Teresina não dispara um só tiro. Ele quebra galhos. Exatamente, o nosso personagem é um... Podador de Árvores. É esta a serventia do martelo niquelado, das cordas, do cinto, da faca de Rambo. Se a vida imita o vídeo, o nosso Don Quixote levou muito a sério a sedução da cinematografia norte-americana. Ficou aprisionado na tela. Não desligou após o filme. Não deu o necessário desconto. Luta contra besouros e percevejos camuflados de verde, como se estes fossem tanques e helicópteros vietnamitas. Imagina uma batalha urbana em que os inimigos se escondem nas árvores. Ou mesmo são elas próprias. E, assim, extirpa obstáculos e, se sobrar um bom soldo pelo serviço, melhor ainda. A exemplo do Rambo do Cinema, o Rambo de Teresina tem um destino errante e incerto. Os seus inimigos não dão trégua. Regeneram-se. Ressurgem. Revitalizam-se todos os dias. São férteis como a mente midiática de seu algoz. Eis uma briga boa.

quinta-feira, 26 de novembro de 2009

Super Magrela


A judoca Sarah Menezes foi indicada ao Prêmio Brasil Olímpico de 2009. A piauiense pode ser eleita a melhor atleta tupiniquim do ano. O mundo já descobriu Sarah. Ela já amealhou vários títulos internacionais. Sarinha é tímida. Precisa sempre da irmã jornalista, Sâmia Menezes, para se desdobrar nas entrevistas, potencializar suas conquistas e caprichar no marketing pessoal. Mas, na essência, é introvertida, calada, fechada. Do tipo da mulher para a qual um homem desavisado apanha de graça, numa parada de ônibus. Não se dá nada pela pequena. È um naco de gente. Num chega aos 50 kg. Foi com essa impressão que eu a vi lutar pela primeira vez, em Fortaleza, há alguns anos. Subi a Serra do Ibiapaba mirando a menina, que estava há duas poltronas da minha, na delegação de judocas piauienses que rumava para a capital cearense, para a disputa de um torneio regional. Imaginava: Meu Deus, coitada! Será estraçalhada! Pobre da irmã da Sâmia! Devia voltar de Sobral! Eis que a guria sobe no tatame. De repente, a transformação. Descabela-se. Desquimona-se. Desconfigura-se. Desmonta adversário atrás de adversário, como se o título fosse batata. E era. Tava no papo magricela. E assim, se camuflando de Jeca, nasce uma legítima heroína mafrense. Já era hora.

quarta-feira, 25 de novembro de 2009

Amarelei

O último final de semana foi marcado por duas eleições que movimentaram Teresina. OAB-PI e PT elegeram seus respectivos presidentes. Algumas semelhanças e muita disparidade entre os dois pleitos. Na Ordem dos Advogados, um tsunami amarelo denunciava, de longe, que os adversários de Sigifroi Moreno seriam massacrados. E foram. Entre os Trabalhadores, o vermelho de Fábio Novo acachapou o de Rosângela Sousa & Cia. As duas vitórias eram lógicas. Insossas até, pelo favoritismo. Mesmo os números foram parecidos. Os vencedores levaram com mais de 60% dos votos. Mas as semelhanças param por aí. Nada se compara à disputa dos causídicos piauienses. Aliás, só uma eleição para deputado ou prefeito pode servir de parâmetro. Uma de vereador ficaria devendo. Meninos eu fui, vi, votei e até venci. Mas fiquei assombrado com o poderio de minha classe. Havia bandeirolas, faixas, adesivos, camisetas, cabos eleitorais, guerra de nervos, bate-boca, tudo. Era um misto de eleição com decisão de campeonato. Uma latinha de refrigerante perdida e voadora, que me encontrou, é a prova cabal disso. Antes, eu só havia sido alvejado com algo do tipo no Lindolfo Monteiro, num Rivengo. Antes, eu só havia visto algo parecido num Hugo Napoleão X Mão Santa. Eu, que já me padronizara de amarelo para votar, saí mais amarelo ainda. De medo. Um dia os jornalistas serão fortes assim.

terça-feira, 24 de novembro de 2009

Panelada Cibernética


Nada postei nos últimos três dias. A emoção de fazer 36 anos me manteve reflexivo. Muitos hão de indagar: mas 36 não é número redondo, tais quais 20, 30, 40. Amigos, eu vos digo: estes números discretos são os que mais ferem, porque não cobram cerimônia, mas passam rápido como uma bala. Ainda me lembro da minha infância, quando as indagações sobre o “por vir” eram freqüentes. Todos achavam que de 2000 não passávamos, mas eu, otimista, ficava era imaginando como seria, por exemplo, 2009. Ruas escuras e desertas? Raça humana escravizada pelos marcianos? Carros elétricos e voadores cruzando o céu plúmbeo? Ou simplesmente nada? Resposta: nada. Descontados alguns progressos, como a invenção da internet, e alguns retrocessos, como o quase linchamento de uma guria que usava minissaia na universidade, não há nada de novo no front. Para o meu desapontamento, claro. Eu apostava na teletransposição, tão profetizada nos filmes de ficção científica. Era única maneira de eu e João Cláudio irmos almoçar diariamente com nossas amabilíssimas mães, em Piripiri, sem que perdêssemos nossos compromissos nas tardes mornas de Teresina. O máximo que conseguimos foi o MSN, em que a gente quase sente o interlocutor do nosso lado. Mas sequer dá para farejar o cheiro de panelada com folha de louro, coadjuvada pelo molho de pimenta malagueta, sob uma mesa de toalha quadriculada, uma garrafa d’água em formato de abacaxi e um farinheiro que já foi um vidro de Nescafé.

sexta-feira, 20 de novembro de 2009

O olheiro da prancheta


Depois de dois vice-campeonatos, o Barras enfim foi campeão piauiense em 2008. Mas naquele ano ocorreu um fato pitoresco no time da Terra dos Governadores. O técnico Flávio Araújo (foto) e o preparador físico Eduardo Pereira comandavam o treino de apronto do Bafo, numa sexta-feira à tarde, visando à final contra o Picos. O time na mão, a torcida empolgada e a confiança reforçada. Mas uma figura estranha causou desconfiança na comissão técnica. Havia, na arquibancada, um homem com uma prancheta na mão que rabiscava mais que o Joel Santana. Experiente, Flávio Araújo prestava atenção no desempenho de seus jogadores e na mão frenética do anotador. E com isso o treinador foi se chegando para a beirada do campo, como quem não quisesse nada, na direção do intruso. Professor Eduardo entendeu o gesto do treinador e também se aproximou, cercando o Lourenço. Outros da comissão técnica e da diretoria fecharam o cerco. Todos desconfiados de que o prancheteiro listava as jogadas do time barrense. Eis que veio a abordagem. Todos falaram quase juntos: “Ô rapaz, o que você anota aí? Veio entregar nosso time para Picos? Dentro de nossa casa? Não tem medo de morrer?”. O rabiscador, amarelo como uma bicicleta dos Correios vendo aquele monte de homens, gaguejando, tremendo, levantou as mãos, soltou o bloco de anotação e gritou: “Calma, gente. Eu não sou olheiro. Sou representante comercial. Estou aqui só anotando os pedidos de venda que fiz hoje pela manhã no mercado. Podem olhar aqui”. E esparramou no chão um monte de requerimentos de caixas de Novalgina, Fontol, Dipirona, Biotônico Fontoura, Tintura Sobral e Cachaça Alemanha. Nunca mais foi a um estádio de futebol na vida.

quinta-feira, 19 de novembro de 2009

Timon Adota um Bicampeão


Ele já foi apelidado de Trator do Beira-Rio e de Patrão do Timão. Quando atuava nos gramados tupiniquins, levava terror a craques como Rivelino, Zico, Reinaldo. Seus carrinhos, sua pegada, sua marcação o levaram a ser bicampeão brasileiro pelo Internacional (1975-1976), a jogar no Corinthians e a vestir a camisa da seleção canarinho. Luís Carlos de Melo Lopes, o Caçapava (na foto, ao lado de Falcão), vive há 20 anos no Piauí. Na verdade, no Piauí/Maranhão. Nos últimos anos, Caça fixou residência em Timon-MA, o mais piauiense dos municípios timbiras. Em entrevistas, já apontou como lugar ideal para morar, de todos os que passou, ao longo de sua carreira, as piauienses Parnaíba, Piripiri e Teresina. Contudo, é de Timon que vem a valorização ao ex-volante. O atual deputado estadual Chico Leitoa destinou verbas para a construção de um centro de treinamento que levará o nome do gaúcho ilustre. Todos aqui perguntam, em mais um aflorar de nossa baixa auto-estima, o que Caçapava veio fazer por estas bandas. Na mesma linha: por que ele ainda permanece aqui. O ex-craque sempre deu o calado como resposta, porque algumas paixões não têm razão de ser ou têm razão de serem silenciosas. A homenagem de Timon a Caçapava escancarou o romance.

terça-feira, 17 de novembro de 2009

Um Dia de Fúria


Este é o título de um filme protagonizado por Michael Douglas. Na película, Douglas é um homem desempregado que chega ao seu limite durante um congestionamento e resolve combater a escória da sociedade com as próprias mãos. Gente fresca, como o barman de um hotel, que se recusa a servir o café da manhã por conta de um minuto de atraso do hóspede ao refeitório, será o alvo de William Foster. A propósito, vi, no cidadeverde.com, a notícia de que um homem que tinha o filho internado no HUT discutiu com um policial, rendeu-lhe, tomou-lhe a arma e saiu atirando em meio aos que se encontravam no recinto. A cena lembrou-me o filme aludido acima. E a pergunta sobre o que teria antecedido o ataque de ira é inevitável. Inevitáveis também as conjecturas. Será que o rapaz entrou em polvorosa com a possibilidade de perder seu filho? Será que ele, no percurso para o hospital, teve de enfrentar o trânsito de Teresina entre 18h e 20h? Será que com o filho se contorcendo de dor ainda teve de aturar a indolência de um funcionário público, que preferia se concentrar no último capítulo da novela a zelar pelo princípio da eficiência no serviço público? Será que, ao reclamar por um mais efetivo e afetivo atendimento, foi peitado por um militar sem curso de recursos humanos, que expele autoridade por todos os poros e não entende que o popular é justamente quem paga o seu salário? Ou será que tudo não passou de um reles xilique gratuito de mais um nervosinho pós-moderno num dia difícil? Sei lá.

segunda-feira, 16 de novembro de 2009

Movimento dos Sem Graça

Amauri Jucá e Dirceu Andrade não chegaram lá. Os humoristas piauienses não conseguiram ir para a final da mais nova maratona de caça talentos do Domingão do Faustão. A frustração dos dois artistas piripirienses também foi a minha. Não pela amizade que eu tenho aos dois. Não pelo fato de ter dividido república com os dois. Não por eu ser conterrâneo e contemporâneo dos dois. Mas pela chuveirada que tomei de Agildo Ribeiro. O comediante carioca me fez crer: eu não entendo bulhufas de humor. Eu já desconfiava disso. Já passei várias noites de sábado digerindo o Zorra Total. O resultado era sempre uma congestão de ridículos. Tudo, menos risos. E concluía: não são as piadas e as personagens que são fracas. Eu é que não entendo de cômica. Agildo Ribeiro ilustra bem esse humor refinado que se preocupa em fazer rir apenas os que contam as anedotas. Desde o Cabaré do Barata, na extinta Rede Manchete, apresentado por Agildo, não consigo entender por que João Cláudio Moreno não lidera as noites de sábado na TV brasileira. Com a piada surrada de ontem, em que ridicularizou mais uma vez o Piauí, sob o sorriso amarelo de Amauri, Agildo ratificou essa minha eterna dúvida. E sacramentou a minha mais nova certeza: eu sou um sem graça.

domingo, 15 de novembro de 2009

O Morumbi é Nosso!


Eu conheço o Leozinho. É este o nome do garoto piripiriense que invadiu o Morumbi, na partida São Paulo x Internacional, dia 28 de outubro. A atitude de Leozinho fez com que o Tricolor perdesse o mando de campo de sua última partida na capital paulista, pelo disputadíssimo Campeonato Brasileiro de 2009. A esta altura, jogar fora de casa pode até significar dar adeus ao título nacional. Leozinho pisou no gramado do Cícero Pompeu de Toledo trajando calção, meião e camisa esportiva, na qual constava a frase apelativa: “eu só quero uma chance para ser jogador de futebol”. Leozinho joga futebol. Aliás, é um bom jogador. Não duvide se com a bola que ele tem hoje, aos 18 anos, o menino, se tivesse a conclamada oportunidade, não chegasse ao Morumbi pela porta da frente, pelo túnel dos atletas, como atração do espetáculo, e não como mais um insosso invasor de campo. Leozinho joga muito mais do que, por exemplo, o Fabão, zagueiro desengonçado, ex-São Paulo, que fez carreira no Morumbi, e que disse ter aprendido a correr roubando galinha na Bahia. Mas Leozinho nunca teve chance de demonstrar seu talento com a bola. Não conseguiu sequer chegar ao 4 de Julho, time profissional de sua cidade. Lá não há como aproveitar valores como Leozinho, novos e feitos em casa. Não há categorias de base, que possam fomentar o esporte em meio aos jovens nativos, afastando-os das drogas e de outros malefícios, como o do ócio. Os diretores preferem valorizar estrelas decadentes. Ou seja, contratar jogadores já encostados, beirando os 40, que lembram os medievais mercenários, guerreiros sem pátrias e sem flâmulas. Ao término do Estadual, mesmo que fique um troféu, não fica dinheiro, não fica orgulho, não fica mesmo ninguém no plantel do time piripiriense. E aos jovens talentos da cidade, resta pegar o Itapemirim rumo a São Paulo, trabalhar de garçom nos Jardins, ser camelô no Brás ou invadir o Morumbi para protestar por este estado de coisas. Leozinho escolheu a última opção.

sábado, 14 de novembro de 2009

O Bandido da Hora


A revista Isto É da semana que hoje termina enfoca o bandido da vez no Brasil. Trata-se de Marcos Willians Herbas Camacho, o Marcola, líder máximo da organização criminosa “Primeiro Comando da Capital”, o PCC. Nosso país tem o histórico de adorar criminosos. Para camuflar a índole dos contestáveis ídolos, usamos do artifício romântico do “bandido social”. Ou seja: aquele cara cujos terríveis feitos são amenizados pela vitimização, por supostas agruras que o sujeito sofreu, do Estado ou do próprio destino, na formação de seu caráter. Misturam-se a isso pitadas de elementos teoricamente contraditórios a um comportamento marginal, tais como dotes artísticos, senso de justiça, charme, sedução, beleza. Pronto: está montado o novo antagonista nacional. Foi assim com Cabeleira, com Lampião, com Leonardo Pareja e, agora, com Marcola. Cabeleira seduzia mulheres com a mesma naturalidade que matava homens. Virgulino esfolava vivo, mas distribuía dinheiro aos pobres, tocava fole, compunha música e costurava. Pareja falava três idiomas, tocava piano e se vestia com grifes. Marcola lê Dostoievski, Victor Hugo, Nietzsche e namora advogadas. Não se sabe ao certo se tal ascendência marginal dá-se por méritos, de fato, das tristes figuras ou por ausência de um herói tupiniquim. Ocorre que hoje não há créditos para Homens-Aranha, Hulks, Supermouses ou outras abstrações do tipo. O super-herói de hoje é o Estado Forte. Como não há no Brasil, os estados paralelos, como o instituído pelo tráfico de drogas, vai pontuando seus ícones. E o pior: formando novos seguidores. Santa Desgraceira, Batman!

quinta-feira, 12 de novembro de 2009

O respeito na padiola

Não será por conta do bairrismo que marca todo piripiriense que eu hoje citarei o nome de minha cidade neste espaço. Desta feita, a coisa é mais grave. Confundir uma hérnia com uma tireóide só perde em gravidade para confundir dois pacientes mirins, deitados em uma maca, esperando o bisturi. Foi o que ocorreu à menor F.R.C.S, de 3 anos, no Hospital Regional Chagas Rodrigues, em Piripiri. Eu tenho um filho de dois anos. Ele se chama Raul. Até o nascimento dele, a palavra sensibilidade não tinha o peso que tem hoje. Sensibilidade do tipo que o sujeito se contorce com a dor física de uma mísera injeção que se aplica em outrem. Pois bem. Contorci-me com todas as injeções que perfuraram o meu pequeno Raul. E não sei como reagiria se ele tivesse de se submeter a uma incisão, por menor que fosse. Inevitável não imaginar como se sentem os pais (carentes) de uma menina de três anos (carente) que, entregue a um médico, perde a tireóide para a negligência. Agora a pergunta que não quer calar: quem pagará pela imperdoável mancada? Quem amparará a família prejudicada? Por quanto tempo resistirá a nossa indignação pelo triste fato? Embrenhando-se pelo problema, constatamos que o nascedouro dele é o mesmo de outras nódoas públicas: o desrespeito ao ser humano, que vai desde a falta de aparato técnico do Estado (aqui dito como instituição: União, Estados e Municípios) até a falta de afinco na hora de formar os profissionais que prestarão serviços à sociedade. Tudo isso agravado pela politicagem, a politicalha, a política canalha. Não custa lembrar que em Piripiri emprego para médico tem sido oferecido, segundo o Secretário de Segurança do Piauí, até pela justificativa de apoio eleitoral para políticos de lá. Uma triste cena que, infelizmente, tem como maior prejudicado o pobre infeliz.

terça-feira, 10 de novembro de 2009

Pinto Caricato

Piripiri é um verdadeiro tablado a céu aberto. Daí a quantidade de humoristas que a cidade dá ao Piauí. João Cláudio, Amauri Jucá, Dirceu Andrade são crias de lá. Até o Benício Bem, que canta até embaixo da ponte, tem se arriscado no ofício, numa lambujem de suas performances musicais. Mas há outra peculiaridade daquela abençoada terra: lá ocorre o corte espacial do dito popular – reforçado cientificamente – de que os opostos se atraem. Os contrários, os adversos, os avessos escolheram Piripiri como estada. Lá, que é norte, tem a matriz da Casas do Sul. Há um cidadão de alcunha Gavião que pertence à mesma família do Pinto (deputado Dr. Pinto). E há um Pinto – ex-volante do 4 de Julho, do River, do Ferroviário-CE - que é defensor ferrenho e amigo pessoal do Gavião (codinome falconiforme utilizado pelo grupo de Luiz Meneses para denominá-lo e amedrontar o rival galináceo). Pois bem. Pinto não foi muito privilegiado pelos traços da beleza, e talvez seja esse o real motivo de seu apelido. Magricela, zambeta, calvo. Bem distante de um David Beckham. Tais características atrapalharam inclusive a carreira do atleta. Reza a lenda que o esportista piripiriense foi contratado pelo Ferroviário do Ceará. Chegando a Fortaleza, ficou alojado no próprio clube, na Barra do Ceará. Fazia todas as refeições na sede do time. Aliás, quase todas. O cozinheiro era gay e tinha uma certa queda pelos jogadores mais robustos. Isso vinha à tona principalmente na hora das refeições. O “Chef” saía de quarto em quarto, batendo à porta, convidando os “menudos” para o rango. Já Pinto... Bom, ele sempre esquecia o pobre Pinto. Passava totalmente alheio ao AP do jogador, que quando sabia da notícia pelos colegas, que já voltavam do almoço, tinha de satisfazer sua fome com costelas, pescoços e pés de frango. Pinto veio embora. Voltou pra casa uma caricatura. Nem a mulher conheceu.

segunda-feira, 9 de novembro de 2009

Irmão versus Irmão

O mundo virou. Eis uma frase que vem me escapando diariamente dos lábios ou mesmo do pensamento. Há mais coisas estranhas ocorrendo hoje do que anunciou a vã profecia. Quando acessei os sites do Piauí na manhã de ontem (8) esperava uma trégua por parte dos absurdos. Afinal, era domingo. Mas não. Eles não entram de folga, não derrubam o cachimbo, não dormem de toca. Era a manchete principal do cidadeverde.com, do meionorte.com, do 180 graus: irmão mata irmão. Aliás, ontem houve mal para todos os sexos. Lá, nos sites, estava também: irmão mata irmã. É triste, mas têm sido comuns esses fatos apocalípticos. Somente de agosto de 2008 para cá, já foram, pelo menos, sete casos de fratricídio noticiados na imprensa local. Desculpem a ladainha religiosa, o chavão apostólico, mas eis a maior prova de que o último bastião das instituições modernas - a família – se desmoronou. O Estado, este, então, figura como mera cereja de bolo. A azeitona de um empadão social fermentado pela histórica falta de compromisso de quem o geriu por anos a fio. As nossas ruas de há muito não mais são um lugar seguro. E sequer dentro das próprias casas as nossas famílias passam incólumes. O mundo virou.

sábado, 7 de novembro de 2009

No princípio, não era um verbo

Para o meu desapontamento, alguns irmãos que prestigiam este espaço ignoraram o nome “Ataiando”. Ataiar é uma expressão eminentemente nordestina. Eu sou como Luiz Gonzaga. Se me perguntassem 10 mil vezes sobre quem eu queria ser na próxima encarnação, a resposta era batata: o mesmo Mundico, do mesmo Piripiri, do mesmo Piauí, do mesmo Nordeste, do mesmo Brasil, da mesma mãe, do mesmo pai, do mesmo jeito: um ataiador de sonhos. Ataiar é cercar, parar, prender, conter, dominar. A gente vai ataiando uns amigos, uns amores, umas conquistas, uns troços, uns bregueços, umas besteiras. Quando dá fé, já contabiliza uma mancheia de coisas. Ataiamos também o que não é bom, tangendo as agruras, as decepções, os desapontamentos, como quem separa a água do barro em poço cacimbão. Somos também ataiados. Pela mão de Deus, por exemplo. Numa artimanha que os homens ingratos chamam de destino, ignorando os créditos do Criador. Somos ataiados por bons amigos, que nos puxam pelo cangote em direção ao crescimento. E até pelos inimigos, cuja água na presa nos amedronta e nos impulsiona para longe dela. O certo é que vence na vida quem melhor ataia. Quem melhor ataia a fome, a orfandade, as doenças, a pobreza, a violência, o desrespeito, a morte. Porque se não se ataiar, ou seja, se se desesperar, aí já era. É preciso descobrir também as veredas tranqüilas, as veredas do Bem. Dentro delas, ataiando com perseverança, se chega. E bem!

Raimundo quase Edmundo


Bom, eu já não me segurava mais. Já são quase dois anos sem uma crônica sequer. Só petições, consultas, pareceres. De jornalismo mesmo, no máximo, um release. Se é que posso chamar isso daquilo. E eu andava uma pilha. Um Edmundo piripiriense. Só sopapos. Até que minha mulher deu-me um ultimato: ou você arruma um canto pra escrever ou vai morrer. E morrer só. Pensei em algo jurídico, mas essa dicotomia Direito/Jornalismo me comprovou que há coisas que se faz por amor e outras que se faz por dinheiro. E felicidade é quando se ganha grana fazendo o que ama. Pode ser que eu ainda ame o Direito, mas, até agora, o que há é só um flerte. Gostoso mesmo é... Escrever. E quando se escreve o que se quer, sem a pressa do deadline, aí vira um tesão só. Bom, estou de volta. Quer dizer, de volta às crônicas propriamente ditas. Não de volta a blogs, território que me soava pantanoso e que eu evitei até agora. E confesso: foi Robson Costa que me encorajou. Não com frases de efeitos, instigações, conselhos ou outras nove horas do tipo. Mas simplesmente por ter blogado também. Se começamos juntos, crescemos juntos, blogamos juntos. Por que não? Agora só falta o Mussoline. E quanto a mim, te quero sim. Como leitor destas ousadas preenchidas linhas ópticas.